Amor, Drogas e Nova York, exibido no Festival do Rio em 2014 com o título Só Deus Sabe (Heaven Knows What, no original), não é sobre moradores de rua em Manhattan. Nem sobre dois sem-teto em especial, Harley (Arielle Holmes) e Ilya (Caleb Landry Jones), que vivem uma relação doentia ao amor próprio e entregue à perdição, na qual traição e sofrimento, desejado ou não, só justificam, são prova viva tanto de amor quanto de ódio para o casal.
Não é um filme sobre o apego, sobre vínculos, sobre uma sina brava, onde a trupe de mendigos, além da óbvia união na condição e pela conveniência, eventualmente se encontra em uma esquina ou outra sem entender como, seguidos ou não, conectados ou não pelo fio do destino. Tampouco é sobre drogas ou sobre viver nas ruas da Big Apple, de favor em favor, de um ponto onde se encontrar a outro onde dormir, filosofar, falar da vida, dos ganhos do dia, se drogar, socializar, brigar, amar, viver um dia após o outro. Também não é um longa sobre as memórias da própria atriz que faz as vezes de protagonista e, motivada pela dupla de diretores Bem e Josh Safdie, escreveu um livro biográfico, ainda inédito, intitulado Mad Love in New York City.
Trata-se de mais um trabalho dos diretores e irmãos influenciado pelo cinema de John Cassavetes. O que vemos é um tom documental, que com câmera na mão busca aproximar o drama o máximo possível da realidade também no âmbito estético, inclusive com atores marginais. Um ponto mais do que chamativo, porém, principalmente por contrastar tanto com essa dinâmica naturalista na direção, ligada ao improviso e daí também a canções ambientes, é a trilha sonora, que felizmente além de adjetivada como chamativa pode sê-la como estupenda. Evocando o psicodélico, eletrônica, mas quase sem o uso de batidas, com variações cirúrgicas, sabendo quando se impor e se retrair ou aquietar, é um contraponto à direção documental de um modo de vida entre tantos, aqui não condenado ou endeusado de modo algum, ainda que com angústias tão acentuadas quanto se poderiam esperar em quaisquer outras circunstâncias dependendo do indivíduo – o clímax, iniciado em um ônibus, é que o diga.
6.8 de 10 | 87% - 66% | 1h 37 min | Trailer |
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